sábado, 12 de maio de 2012

queima/dura




- Anda cá, minha puta!

- Respeitinho é lindo e eu gosto!

- Gostas?! Pois então vais esperar sentada, porque respeito por ti é coisa que não consigo sentir.

- ….

- Olha para mim! Olha! Já não saio desta cama há mais de uma ano. Não consigo comer sozinha, cago-me e mijo-me sem controlo. E tu estás à espera de quê?

- De nada.

- Ai não? E andas por aí a brincar às escondidas, é?

- Não sei do que está a falar.

- Eu explico-te: estou a falar do Jorge, do Paulo, do João, da Isabel, da Francisca, da Maria… de tantos, ouviste? Tantos!

- A vida é assim.

- Ai é, sua puta?! É o caralho! É a vida e a morte uma e a mesma coisa, vivida a vida. Vive-se e por isso morre-se. Mas quando ainda mal a vida deu frutos, quando ela nem a meio caminho vai… ! Ein? Que morte é essa? Explica-me que eu estou a perder a paciência. O que faço eu aqui? Ainda tenho que viver para quê? Para quem?

- Isso não está nas minhas mãos. Nem nas suas.

- Vais dizer-me que está nas mãos de um deus a quem nunca vi a cara? Ora foda-se!

- Se não acredita, o problema é seu.

- Não. Eu não tenho problema nenhum, porque não tenho problemas com quem não conheço e muito menos com quem não existe. Mas tenho um grande problema contigo. Ai isso tenho!

-…

  - Se não tens nada a fazer, desanda daqui, antes que me atire ao chão.

RUA! …

ANDOR! …

VASA! …

(Chega a empregada do lar, aflita com a gritaria e uma injeção pronta para acalmar a D. Emília. Mas quando se aproxima da cama, ela dá-lhe uma dentada no braço, bem forte. A Zézinha desequilibra-se, com as dores e a D. Emília, em total desvario, solta um estertor e cai abaixo da cama, finalmente morta.)

terça-feira, 1 de maio de 2012